sexta-feira, 25 de outubro de 2013

Vladimir Souza Carvalho escreve sobre Tambores





                               OS TAMBORES DA TERRA VERMELHA
Vladimir Souza Carvalho /// Membro das Academias Sergipana e Itabaianense de Letras.
O silêncio se quebra porque o barulho é forte. Mas, não é barulho de bomba, nem de trio elétrico, nem de aparelho de som embutido em carro da mocidade festeira, nem de buzina de veículo. Aliás, não é nem barulho, mas som ritmado que os satélites e radares secretos apontam para a Terra Vermelha, embrenhada na Itabaiana dos nossos amores, e, então, as mensagens, que os serviços de inteligência trocam, direcionam para o ponto chave: o barulho é provocado por tambores. Bom, tambores, bem mais marcial, bem mais selvagem que a minha percepção calculava. Era capaz de jurar por todos os santos que figuram nos altares da Matriz de Itabaiana que, em verdade, os serviços de inteligência estão errados: o som não é de um tambor, nem de dois, nem de três, nem de número algum. Esse som é de uma orquestra sinfônica. E, acrescente-se, não é barulho, nem som solitário, é música, e, melhor ainda, da boa.
É assim que encaro Tambores da Terra Vermelha, último livro de Antonio Francisco de Jesus [Aracaju, Info Graphics Gráfica e Editora, 2013, 252 pp], continuação implícita da saga iniciada com Os tabaréus do Sítio Saracura, superlotado pelos casos vistos e vividos, no desfile de fatos e de pessoas, na vida monótona e difícil dos que não conseguiam se situar além de sua propriedade, trazendo à tona ocorrências corriqueiras, como a aquisição de uma carroça de burro, a compra de um jipe, entre outras, que ganham sal e pimenta com a sua exposição, como se fossem os fatos mais fantásticos e inusitados do mundo.
  O autor, na pele de quem teve de voar para se libertar do campo, batiza o narrado como contos. No momento de espremer o limão, o sumo que cai é outro, na exposição de um cenário com raízes firmadas na reiteração hoje do dia de ontem, englobando aquilo que, dentro de casa, no interior da propriedade, nas estradas para Itabaiana, ontem se fixou em sua mente, a ponto de hoje, transforma-los num excelente prato para a sociologia da história privada da Itabaiana rural, na abundância de situações e circunstâncias, que mostram como, até bem pouco tempo, uma família numerosa, como quase todas, se movia no seu dia a dia e no que ocorria ao seu redor.  
Antonio Francisco de Jesus, de memória privilegiada, é um autêntico filho da Terra Vermelha, homem que a infância modulou, e nem os estudos em seminário e em curso superior, nem a vida na cidade grande, nada o libertou da característica de tabaréu do sítio Saracura. Contudo, se a natureza não lhe concedeu vocação para,  também, como o pai, ser agricultor e vendedor de farinha na feira do Aracaju, o fez leitor de bons livros, e, depois de muita leitura, escancarou as portas para a arte de escrever, enchendo-o de talento para contar as vivências da infância e outras mais, o que torna sua narrativa mais real e importante, porque é um homem do interior que fala de seu mundo, sem ocultar nenhuma víscera.
Evidentemente que Tambores da Terra Vermelha é muito mais do que essas palavras traduzem. É só lê-lo para constatar a veracidade do afirmado. 
Correio de Sergipe, 28 de setembro de 2013.


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